Os muitos talentos e as muitas histórias do Professor Ceguinho


Em busca de pessoas que tivessem boas histórias para contar nesta edição de aniversário de 115 anos do Jornal A Cachoeira cheguei até a casa do Professor Ceguinho. Um senhor muito simpático que conheci durante o recenseamento do IBGE em 2010. Soube de antemão que ele reservava na memória, histórias que fizeram parte da vida de dezenas de cachoeiranos e assim fui conversar com ele. Ceguinho abriu a casa e o coração. Mostrou ser um homem simples que gosta de contar histórias e que talvez, por isso tenha exercido tão bem a profissão que escolheu e com a qual, trabalhou por quatro décadas.

Logo de cara, descobri que o nome dele, na verdade, é Gilvandro Soares da Cruz. Mas, ele mesmo brinca: “Na rua, as vezes chamam: - “Gilvandro!”E eu não ligo. Quando chamam: - “Ceguinho!”Aí, eu sei que é comigo.” (risos). O apelido o acompanha desde a infância. Um amigo apelidado por ele de Zé da Peida resolveu revidar a homenagem e o batizou de Cego Orgulhoso. “Eu sempre fui vesgo. Mas, fazia sucesso com as meninas” comenta. E o apelido pegou: “Minha mãe não gostava, mas, eu nunca liguei.”

O garoto Gilvandro era também atleta. O esporte preferido era o basquete e ele era uma promessa. Foi um dos destaques da seleção de basquete de Cachoeira. Duas vezes campeão baiano, chegou a passar por alguns clubes de Salvador. Mas, a carreira nas quadras não engrenou. O garoto talentoso retornou a Cachoeira, cresceu e se tornou professor. O apelido mudou também. De Cego Orgulhoso para Ceguinho, professor do Colégio Estadual da Cachoeira e incentivador do esporte na cidade.

Ele relembra com saudade a epopeia da construção do estádio municipal de Cachoeira que hoje se chama 25 de junho, em homenagem a data magna da cidade. Segundo ele, antes havia apenas o pequeno campo do Fluminense de Cachoeira e o presidente do clube convocou os torcedores a ajudar na construção do estádio. Mas, não só os torcedores do Fluminense participaram do mutirão. Todos os amantes e incentivadores do esporte reuniram-se e ajudaram carregando tijolos, cimento e pondo a mão na massa, literalmente. Depois que o estádio ficou pronto os torcedores construtores o transformaram numa verdadeira Bombonera. A seleção de Cachoeira foi, por muito tempo, imbatível jogando no seu estádio. As partidas mais marcantes eram quase sempre contra a arquirrival seleção de São Félix.

Ceguinho foi também vereador por dez anos consecutivos e por isso hoje reclama dos políticos faltosos “Naquela época, as sessões aconteciam duas vezes por semana, durante o dia, a gente não recebia um centavo. Hoje em dia, eles ganham bem, é uma sessão por semana e eles ainda faltam” Hoje, o ex-atleta e ex-político Ceguinho caminha com dificuldade, por conta de um derrame sofrido em 2009. Só sai de casa para ir a barbearia. Passa a maior parte do tempo em casa e só acompanha os esportes pela TV. Ele revela que sente falta dos irmãos que já faleceram e dos amigos da época de juventude. Longe das salas de aula que comandou por quarenta anos, ele também mostra preocupação com os jovens e a educação de hoje em dia: “Naquele tempo, a gente levantava de manhã cedo para fazer Educação Física e ninguém faltava. Hoje em dia, não é mais assim. Nesses anos todos, eu quase não faltei. No dia que eu não ia, podiam saber que, ou eu estava doente, ou tinha acontecido alguma coisa.”

Um homem que se dedicou tão bem a tudo o que se propôs a fazer na vida, realmente merece um descanso. A nós cabe o prazer de sermos ouvintes deste homem. Gilvandro Soares da Cruz, o Ceguinho. Um exemplo de professor, político, atleta, cidadão, enfim, um exemplo de pessoa. 

Um comentário:

  1. É de profissionais responsaveis como este que a Educação do nosso pais,mais precisamente das nossas cidades Cachoeira e São Félix precisa.

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